sábado, julho 16, 2016

MARIA GORDA

Maria Gorda, era dona do cabaré mais famoso de Santa Cruz, tinha alguns concorrentes, mas ela era a casa mais frequentada. Os maiores concorrentes, eram, Chicó de Maria Anjo, o Copacabana de Michael e Gonzaga de Chio.

Existem muitas histórias do cabaré de Maria, que envolvia personagens da cidade.
Uma delas, um funcionário do BNB, que adorava uma cervejada e ouvir música, mas era casado, frequentava as festas sociais da cidade e tinha uma mulher muito braba. 

Um dia, começou a beber no BNB Clube e quando foi anoitecendo, resolveu continuar a farra, em Maria Gorda. Chegando lá, sentou-se numa mesa pediu umas  cervejas e começou a beber e ouvir música.
Com a demora de chegar, a mulher, que sabia que ele estava no BNB, dirigiu-se pra lá, para levá-lo pra casa, pois ela sabia que ele gostava de emendar na bebida. Não o encontrando no clube, perguntou se alguém o viu e a mulher de outro bancário, em solidariedade, disse que ouviu ele dizendo na saída, vou tomar uma lá no gango de Maria Gorda e vou pra casa. Ela se informou onde era o gango e partiu pra lá. Passou de frente a igreja, se benzeu, pediu perdão a Deus, se por acaso houvesse uma morte, passou na esquina de Edvaldo e desceu pra lá.

Chegou na porta , perguntou se ali era Maria Gorda, disseram que sim e já começou a juntar gente. Ela pegou os três filhos pequenos e foi entrando, viu uma mesa com umas cervejas e vários copos, sem ninguém sentado. Os amigos quando a viram correram e ele tinha ido ao banheiro, quando voltou que viu ela sentada na mesa, correu pra lá e foi gritando:
-Você tá louca, o que é que você tá fazendo aqui ? Ela respondeu:
-Vim tomar uma cervejinha com você e dar um lanche pras crianças, pense num barzinho animado.
Ele pegou ela pelo braço e saiu puxando para o carro com as crianças, e sumiram.

Eu gostava muito de Maria e ela gostava muito de mim, ao ponto de nas minhas farras até na madrugada eu me dirigia pra lá, ela separava um quarto pra mim e dizia, "Jeci, dê um copo de leite a Chaguinha e não deixe as meninas perturbarem ele não, que ele já tá muito bicado e quer é dormir.

Quando os meus amigos iam para a fazenda, correr atrás de boi, no final da tarde, quando voltávamos, íamos direto pra lá. Uma mesa perto do balcão com cerveja ,tira-gosto e música de Waldick Soriano. 
Ela avisava logo as meninas:-Não vão naquela mesa não, que eles vieram só pro bar, e a conta é grande, façam o trabalho de vocês com os outros fregueses.

Numa dessas vezes, chegamos por volta das oito da noite e começamos a beber,ela chegou perto do meu ouvido e cochichou,"Vocês só podem ficar aqui até as 10h" por que? eu perguntei, ela me disse, "ordens do Capitão Pereira, tem que fechar 10h". Quando deu 10h ela fechou tudo e eu disse, "Maria, bote a música baixinha, apague as luzes do salão e nós vamos para um quartinho lá atrás e Jeci fica colocando as cervejas por cima da meia parede",assim fizemos.
Éramos eu, Eduardo Tabica e Gondim Bagadinho. Ficamos os três ouvindo Waldick e tomando as cervejas, sentados em uns tamboretes.
Escutamos um barulho forte e olhamos para o portão dos fundos que foi derrubado com um chute e entraram dois soldados:
-Vocês estão presos, por ordem do capitão. 

Eu argumentei, "amigo aqui é propriedade particular, eu aluguei esse quartinho e você só pode entrar com um mandado". Ele disse:-Eu não quero nem saber, ordem é ordem.
Na mesma hora Gondim puxou do bolso, uma carteira de oficial da reserva do exército, NPOR, e apresentou e foi logo falandro:-Enquadre-se soldado, sou um oficial do exército. 

Confesso que gelei e pensei, agora vamos presos mesmo, mas os soldados se enquadraram  bateram continência e um cabo falou - Permissão pra me retirar.
Gondim respondeu, "saiam daqui e não olhem nem pra trás."Na mesma hora, entramos no carro e fomos pra casa da rua do riacho, onde eu morava.
No dia seguinte, 5 horas da manhã, chega Maria Gorda lá em casa, gritando na calçada:-SEO LOURENÇO, SEU LOURENÇO......
Papai saiu, "o que foi Maria, uma hora dessas"?
-Chaguinha teve lá em casa ontem com uns amigos, depois das 10h e o capitão mandou prender as meninas todinhas, lá de casa.
Papai disse, "fale com João de Gan, que é amigo do capitão, que ele solta".
João soltou as meninas.

No carnaval, a  criançada ia para o Trairi Clube, na matinê e um belo dia chega Maria Gorda com os filhos pequenos na porta do clube, foi um reboliço grande de algumas senhoras da sociedade, querendo impedir a entrada dela e dos filhos. João de Gan, era o presidente do clube e foi chamado imediatamente. Chegando lá, pegou Maria pelo braço e as crianças dela e levou pra dentro do clube e disse, "pode trazer seus filhos todos os dias de carnaval, com ordem minha, o cabaré é lá e aqui é pras crianças brincarem".

Teve um tempo que eu criava muitos bodes lá na Serra do Espinho e um dia Helenildo do restaurante, falou pra me comprar um carrada de cabritos. Negócio feito pegamos os cabritos em um caminhão e mandamos direto para o matadouro. Eu disse, "Helenildo, vá pesando os cabritos e de vez em quando mande um fígado e um coração ali pra Maria Gorda, pra tomar com cerveja, que eu vou esperar lá". Nesse dia quem estava comigo lá era o amigo Hugo Tavares.

Antes de ir pegar os bodes eu passei lá em Maria, que eu vivia muito no matadouro e preveni pra ele comprar uma grade de cerveja e botar no congelador. Começamos a tomar cerveja com coração, fígado e rim dos cabritos.
Quando terminou tudo, Helenildo chegou com o peso e eu disse, "Maria, veja minha conta, que eu já vou embora". Ela já tava com o papelzinho na mão e me entregou, eu disse," Maria, que cerveja cara da  bixiga é essa" ?
Ela falou:- São as cervejas, os ovos cozidos (coloridos), a conta do SAAE e a conta da luz, que a coisa tá "rim" meu fíi e eu só posso me pegar com você.
Paguei, feliz.

Uma amiga, Beth Jatobá, certa vez me pediu, "Chaguinha, arranje uns cinco votos pra papai (Bigodão, Bezerra do Acari), pra deputado." Eu prometi arranjar.
Peguei quatro pessoas da minha família e disse pra mim mesmo, vou fazer um teste com Maria Gorda, que ela falou que votava em quem eu pedisse, e fiz o pedido. Por segurança, incluí mais duas pessoas, no caso de falhar algum. Saíram sete votos pra Bezerra em Santa Cruz, Maria Gorda era de inteira confiança.

Como eu ia , praticamente, todos os dias ao matadouro, pesar gado, passava sempre no portão dos fundos da casa de Maria. Um dia, ela estava me esperando. Quando me aproximei, ela que tava sentada num tamborete no portão, levantou e saiu correndo com o braço levantado pro lado do carro. Parei e perguntei, "o que foi que houve Maria"?
-Meu fíi eu tô alejadinha, não aguento mais dormir em colchão de capim, você tem que me arranjar um colchão.
"Tá certo Maria, vou resolver".

Saí de lá, entrei na rua grande, rua da feira, fui lá em Quinha e disse, "Quinha eu quero um colchão e quero um favor. -Pois não Chagas, pode dizer.
-Pegue esse colchão, leve lá em casa, pegue o meu que ainda tá novinho e deixe lá na casa de Maria Gorda.
No outro dia de manhã, quando passei na frente do quintal dela, ela gritou:-Meu fíii, já tô melhor da coluna, você é um anjo, amor.....

Chl
Jul/2016