sábado, dezembro 24, 2005

FELIZ NATAL


Acabei de te ouvir
sentí em tua voz
cansaço e dúvidas,
talvez saudade,
quem sabe amor.
Vou esquecer as mágoas
vou esquecer os males
vou viver em paz
vou viver de amor.
Feliz Natal.
Chl
Dez/1985

domingo, novembro 20, 2005

INSPIRAÇÃO

Ilustração: Fábio Eduardo

Onde estás inspiração
te ofuscastes n'algum outro sentimento
o amor, talvez
ou na angústia da espera?
Do frenesi
da doce agonia
que envolve o corpo
até a morte,
que me faz
divagar.
Divagar
como música
como felicidade
como tudo que é bom.
Chl

Abr/1978

segunda-feira, novembro 14, 2005

ACORDAR

Ilustração: Tarsila do Amaral

AH!
Como é bom sonhar
um sonho bom,
feliz.
AH
Como é ruim acordar
para uma realidade,
triste.
Chl
Fev/1979

sábado, novembro 05, 2005

O DIAMANTE


A chuva batia no telhado
caía sobre a planta
que cultivas
a flor que eu ganhei
ainda não murchou
mas, se você disser que pode.....
sob o telhado
o presente é um futuro,
arquitetado no passado.
no inconsciente
lapidar um diamante
gera desamor,
os termos técnicos nos aproximam
e o diamante adormece
sobre meu peito
na frescura do ar condicionado
Chl
Mar/1978

segunda-feira, outubro 31, 2005

FRUTOS DO MAR

Puerto Mont - Chile

Na tarde fria
o cheiro forte
o mar do pacífico
nos Andes, no Chile
na costa de lá.

A barraca de feira
no lago, na beira
na beira do mar.
A brisa serena
o frio danado
em Puerto Mont
aprecio calado
os frutos do mar.
Chl

Set/1979

terça-feira, outubro 25, 2005

A PARTIDA


Numa manhã de sábado
tuas lágriamas,
partiam meu coração
teu andar
leve, macio
dizia adeus,
era despedida.
Em meus olhos
a lembrança
do teu sorriso,
em meu peito
a ternura
do teu amor
em minh'alma
doía o teu sofrer.
Chl
Mar/1977

sábado, outubro 22, 2005

DAVID E GOLIAS

David e Golias (Caravagio)

NA DÚVIDA DO SIM OU NÃO
DAVID REIOU GOLIAS


Pense numa confusão
que está acontecendo
esse tal de referendo
na dúvida do sim ou não.
É um dia de tensão!

Muitas festas, estrepolias
muitas farras e orgias
e o povo todo confuso
vai entrar em parafuso
-David reiou Golias.
Chl
Out/2005

domingo, outubro 16, 2005

A GRUTA

Ilustração Hugo Macedo


O negro da noite
envolve as pedras,
o claro da lua
está pra chegar.
Na água parada
na relva macia,
projeta-se a luz
da gruta sagrada.
Chl
Set/1978

domingo, outubro 09, 2005

MADRUGADA

Foto: Hugo Macedo

É madrugada
a brisa fria
sopra de cheio
sobre a relva:
É primavera.
O cheiro bom
da flor do mato
a relva fria
orvalhada
anuncia:
A manhã
O canto do rouxinol
vem com ela
e canta mais,
no seu ninho
a relva orvalhada:
Diz que é primavera.
Chl
Set/1978

quarta-feira, setembro 28, 2005

EMERGÊNCIA


Manda chuva meu Jesus
qu'é prá muiar
meu sertão
pra nos livrar
da emergência
e da grande sequidão.
Passou de Janeiro a Março
e a chuva não chegou
o povo e o gado com sêde
e as cacimba secou.
Míio plantado cêdo
antes de palmo muchô
o feijão já fulorando
c'um sol quente esturricô.
Os home já tão faminto
e cheios de precisão
o governo aperreado
procurando solução.
O gado cum fome e sêde
tão trilhando os caminho
os home faz as coivara
para ir queimando espinho.
Quando a catingueira desfóia
o pereiro fica pelado
quando mameleiro mucha
o mundo tá desmantelado.
E assim tá meu Nordeste
nesta divina opção
na Bahia muita lama
e aqui só tem torrão.
O povo já tá faminto
saqueando os armazém
furtando por precisão
enquanto a chuva não vem.
O governo mal começado
com um projeto que o diabo
colocou em sua mão,
dá cumê a muita gente
com tanto papel, ôxente
eu acho que não dá não.
Nordestino tá cansado
de vê o tempo passado
sem conseguir seu desejo,
agora nessa emergência
porque não se bota urgência
e se implanta o sertanejo?
Um projetão danado
c'um tanto dinheiro gastado
sem se ver a solução
só dá emprego a dotô
para gastar em papel
e passagem de avião.
O Nordeste no inverno
é sol quente céu azul
e os problemas daqui,
ficam sendo resolvidos,
nos gabinetes do Sul.
Dê recurso e autonomia
aos nossos guvernador
prá vê se algum dia
pelo menos "ameidia"
se vê cheia a "vazia"
do pobre do agricultor.
Jesus te peço de novo
manda chuva com urgência
pra vê se acaba de vez
com o blefe da emergência.
Chl.
Abr/1979

domingo, setembro 25, 2005

O BATIQUE

Candido Portinari -1944

Na parede da sala
um mural de dor
pai,mãe, filho
o cachorro e um burro
a mala vazia
e a fome:
Retirantes.
O homem
magricela
faminto
doentio,
é tão forte
que anda,
sua sombra
se confunde
com um mandacarú
com os espinhos
espetados em sua língua.
A mulher
trapos no corpo
molambos na cabeça
leva em suas entranhas
duas coisas típicas,
do nordestino pobre:
A fome
e uma criança.
A dor e o amor
unidos na miséria.
A criança
se confunde com o burro
e é puxado pelo cachorro,
no peito,
a alegria dos alienados
nos lábios,
o sorriso da ignorância
no andar,
a conformação dos oprimidos.
Os traços negros
mostram o sol ardente
na parede da sala
no batique de dor.
Chl

Ago/1978

sábado, setembro 17, 2005

O MEDO

Ilustração Orf

A luzinha acendeu
a porta se abriu
eu entrei.
Mil olhos
me olhavam
mil gentes
acotovelavam-se
junto a mim,
dentro do elevador.
O medo
estampado
em meu rosto
no fundo
dos meus olhos,
a debilidade física
a ressaca moral
o calor
da segunda-feira.
Eu temia
eu tremia,
o medo
que ali ruisse
a fortaleza
do meu eu,
o medo
que ali cessasse
o prazer
de ser forte.
Interiormente
a vida é uma balela
a estrutura física
é frágil
a mente
é débil.
Mesmo assim
tudo vai subindo,
de repente
pára,
a porta se abre
e eu saio.
Chl
Ago/1979

quarta-feira, setembro 14, 2005

O LOUCO


As palavras do louco
ecoavam na Dr. Barata
"Vocês querem um mundo melhor"?
"Vocês querem um mundo pior"?
"Vocês acham que sou espírita,
ateu,não tenho pátria"?
Fui andando sem resposta.
Não sei se é um louco
ou um bêbado
não sei se queremos
um mundo melhor
ou pior.
Nem sei se sou espírita
ou ateu,
Talvez, esta seja a minha pátria
...............................................
...............................................
Também não sei ...............
Chl.
Ago/1979

domingo, setembro 11, 2005

TRABALHADOR DE ESTRADA


O sol se pondo
com raios frios
em agonia,
a lua no crepúsculo
se enche de fantasia
e a noite quer começar.
Na estrada
a margem estúpida
insiste em se sujar
e o homem, bóia-fria
está ali para limpar.
Na barraca de lona
as redes estão armadas
de lá para cá
de cá para lá.
Os homens de capacete
e roupas iguais,
cor de laranja
já desbotadas,
sentados nas pedras
sentados no chão,
esperam à beira do fogo
que esquente o feijão.
É feijão e farinha
é rapadura e só,
um pouco de água
e a dor no corpo
o homem se deita cansado
e dorme a noite toda
sem pensar nem em sonhar.
A lua ainda bonita
agora parece mais fria
o seu brilho prateado
está em leve agonia,
a madrugada se dissipa
com o sopro da ventania
um raio de sol desponta
traz consigo um novo dia.
O homem volta pra estrada
pra cuidar do seu asfalto
pra limpar a sua margem
desde baixo até o alto,
ele está sempre calado
trabalhando pro progresso
cuidando do automóvel
que um dia nesta estrada
lhe matará atropelado.
Chl
Ago/1979

sábado, setembro 03, 2005

CONTRACULTURA

Tela de Valderedo

A mente humana
hipnótica e submissa
se forma pela cultura
imune, púdica
religiosa e desumana.
Corpo são, mente sã.
O corpo não pode sentir "coisas"
que a mente não deve pensar
para não se tornar suja
pecadora,
pecar por pensar.
Entre o sentimento físico
e o pensamento proibido
cria-se o trauma
a tara
o pensamento livre
da mente sã.
As manifestações corporais
do corpo são
são a própria pureza
e simplicidade
do esperma humano.
Chl
Jul/1979

sábado, agosto 27, 2005

CARRINHO DE FEIRA


Na noite negra
de madrugada fria
ouço o rolar.
Como se na caatinga
o carro de boi viesse
com muito gás no "cocâo"
a cantar, cantar....
Qual nada,
era a roda
de um carrinho de mão
guiado por um menino.
Na cama quente, deliciosa
um copo de leite com espuma,
na rua,
o menino da feira
boca amarga
estômago vazio
a procura de dinheiro.
O carrinho enche
sua barriga ôca
abacaxis
mangas
laranjas
bananas
tomates,
e o menino aspira
seu almoçar.
Sem abacaxis
ele recebe
a cédula velha
de um cruzeiro
rasgada,
desvalorizada
e volta
em busca doutra carga
para aspirar
seu almoçar.
Depois,
volta pra casa
roda calada
denuncia a tristeza
do dono menino
do carrinho de feira.
Chl
Set/1978

quarta-feira, agosto 24, 2005

CAMINHO DA DROGA



Lembro da primeira vez que bebi pra valer, no dia do meu aniversário de 15 anos.Acho que bebi duas ou três doses de Ron Merino com Crush. Foi o suficiente.Fiquei completamente embriagado.
No carnaval, na sede velha do América Futebol Clube, levei uma lança perfume Rodouro, um recipiente de latão dourado, com um dispositivo na ponta para liberar o gás. Munido de um óculos de plástico, imitando o Ray-Ban americano, amarrado com um elástico para evitar levar um jato de lança perfume no olho.No meio do salão, pulando ao som de vassourinha, mirava nos olhos dos amigos e jogava perfume para atingir o olho e deixar ardendo o resto da tarde. Um amigo, um pouco mais velho do que eu, pegou no meu braço e falou,
-Não faz isso, não estraga a lança.
-Porque ? Perguntei.
-Coloca aqui na cortina que vou te mostrar pra que serve.
Shhiiii, ensopei a cortina, no canto do salão, na sede antiga do AFC, perto do corredor dos banheiros.Ele agarrou a cortina com as duas mãos e colocou no nariz, aspirando com toda força; fiquei assustado quando vi ele despecando com todo o corpo no chão. Imaginei: morreu.Logo logo, ele levantou e pulando alegremente no salão, me disse cheio de convicção:- É pra isso que serve.
Terminou o baile do domingo de carnaval e eu fui pra casa pensativo, querendo experimentar,mas com medo de desmaiar.Foi só o que deu. Parei no canto de um muro perto do seminário São Pedro, tirei o lenço do bolso e sapequei lança, até ensopar.Coloquei no nariz e logo tirei porque era gelado e eu não agüentava. Fui me acostumando, até que aspirei com todo fôlego. Escureceu tudo. Apaguei.
Quando acordei, minha cabeça doía muito e meu Deus, eu estava todo mijado.Passei a mão na cabeça, tinha um galo enorme.Quando cheguei perto de casa, todos estavam na calçada pra ver os papangus que passavam e o corso dos blocos. Entrei correndo e cantando tanranranran, o frevo vassourinha,direto para o banheiro pra ninguém notar que minha bermuda estava toda molhada de mijo.
Depois de algum tempo, já acostumado com a bebida alcoólica, já tomava Rum com coca-cola, cerveja e um pouco de aguardente, resolvi inventar de fumar.Comprei uma carteira de Cônsul, porque tinha um gostinho refrescante, e eu tinha que mostrar que tava virando homem, pois meus amigos todos já fumavam.Não me dei bem com o cigarro, na metade da carteira, dei a primeira pessoa que encontrei na rua; a partir desse dia eu não mais suportei cigarro e se colocasse um na boca, passava o resto do dia cuspindo.
No limiar da década de 70, eu já bebia tudo, e tomava muito porre de lança, só não conseguia fumar, mas não me incomodava se alguém fumasse do meu lado.
Um certo dia já com muito uísque na cabeça, me apresentaram um cigarro de maconha, duvidei pelo fato de não gostar de cigarros, mas encarei. Peguei o bicho na ponta dos dedos, tentando imitar os outros, e enchi a boca de fumaça, sem saber se engulia, soltava, ficava esperando desaparecer por si só, até que tive um acesso de tosse e soltei tudo. Escutei os comentários: - Esse cara é careta , é sujeira,melhor deixar pra outra hora. Confesso que depois me acostumei, só não aprendi a tragar até hoje, tampouco falar com o peito cheio de fumaça.
Bebia praticamente todos os dias e na época de férias, de final de ano,então o consumo era dobrado. Um belo dia apareceram dois caras vindos do Rio, com uns papelotes de cocaína; eu nunca tinha visto como era.Depois de muita conversa, resolvi comprar e experimentar.
Era feito todo um ritual, espelho debaixo de um abajur, lâminas de gilete para estirar as carreiras e uma cédula de dólar enrolada feito um canudinho para aspirar. Observei como era feito e em seguida coloquei o canudinho no nariz e aspirei a carreirinha de pó.Não senti absolutamente nada a não ser um gosto de tinta na boca e fui aconselhado a passar as sobras do espelho nas gengivas, como se joga o resto das hóstias no cálice de vinho.Saímos pra farra.
No dia seguinte eu fiquei pensando durante muito tempo.Jamais tive uma sensação tão boa em toda minha vida. Era como se todos os problemas não existissem mais, e toda euforia e alegria tomava conta de você.Resolvi que decididamente não queria mais aquilo, pois sabia que não era real, era fictício e perigoso e numa atitude sensata de equilíbrio abandonei para sempre, algo que eu achei fantástico.
Fiquei apenas bebendo muito e no carnaval continuava cheirando lança; na ressaca tomava gluco-energan com fostimol e energisan (nem sei se ainda existe hoje), a noite tomava reativan pra aguentar o repuxo do baile do clube.
Sobrevivi, hoje tomo cerveja gelada e de vez em quando tomo uma meladinha com caldo de dobradinha no Beco da Lama.
                 Frei Carmelo
                   Ago/2005

sábado, agosto 20, 2005

O FETO

O que é que tens
nessa barriga
que se agita
que tu afagas.
Fico curtindo
tua barriga
que cresce
aos poucos
como uma flor
que desabrocha.
Em tuas entranhas
cresce um filho
do amor, é claro
e nove meses
de quarentena
como se lá fora,
a liberdade existisse.
Chl.
Dez/1978

quinta-feira, agosto 18, 2005

A TENDA DO CIGANO

Foto : Hugo Macedo

Descia pela ladeira do sol , era sexta-feira , em busca de aventuras nos bares da orla. Pegou a direita no clube Bandern, seguiu por Areia Preta passando pelo “bate papo” foi até o “é nosso” e encostou no “iara bar”.
Pediu uma cerveja, estupidamente gelada, pra lavar. Nas mesas algumas pessoas bebiam e fumavam muito, mas, não viu ninguém conhecido, pagou a cerveja e saiu de volta no caminho da Café Filho , chegando no girador da rua , sentiu vontade de ir ao “puteiro”, logo à esquerda vizinho ao bar “castanholas”, mas preferiu encostar no Chaplim que era o bar mais badalado.
O bar estava cheio de gente e numa mesa no canto estavam Paulo e Roberto, dois amigos das freqüentes noitadas.
A mesa ficava encostado na balaustrada do lado do mar, e as vezes salpicos das brumas batiam em você. O clima muito agradável, um pouco frio, por causa do vento marinho que soprava, convidava para tomar uma bebida mais “quente”,destilada ; - Garçon, traz um Teachers duplo, por favor.
Chegou Neuza, uma velha amiga, dá dois beijinhos em todo mundo e senta na mesa.- Alguém tá afim de um baseado ?
-Calma menina, acabamos de chegar.
-E daí! Garçon me traz uma cerpinha. Vocês sabem que tomando minha cervejinha sou “ pau pra toda obra”. Vamos pra boate hoje?
Neuza era uma jovem de 23 anos, universitária, fazia sociologia na UFRN, inteligente, culta, mas, como se costuma falar, meio “porra-louca”. Tinha mania de dizer que topava tudo, que era pau pra toda obra; quando estava embriagada dizia sempre : “Eu sou obra pra todo pau”.
Resolveram todos ir pra Royal Salute. Tina Turner, Barry White, era o som que rolava. No pedestal do DJ, Black Zé, dançava a noite inteira, sozinho.
Dançaram e beberam até as quatro da manhã. E agora pra onde vamos?
-Tenda do Cigano, gritou Neuza.
-Que tal, uma ginga frita no Jangadeiro?
-Você quer ir ver as putas, Francisca, Carioca, Maria Perna Grossa, que vende calcinha na praia! Vamos pra Tenda, tomar caldo a cavalo com batida de amendoim.
Saíram da tenda por volta das 5:30 hs, o sol vinha rasgando o mar, como uma imensa bola de fogo avermelhada.
Neuza cheia de desejos, perguntou: -Você já foi ao Corujão?
-Já, mas agora quero mesmo é ir pra casa dormir.
-E mais tarde ? , Insistiu Neuza.
-Tenho um compromisso as duas horas da tarde, jogar sinuca, disputando cerveja lá no “pé do gavião, na Redinha.
-Tô dentro, respondeu ela se despedindo.

                  Frei Carmelo
                    Ago/2005 

sábado, agosto 13, 2005

O BUGARI



Morreu o bugari,
porque seu cheiro acabou.
A pétala branca
esmaeceu
perdeu a cor
ficou marrom
pálida
quase preta,
o bugari murchou.
Sobre a estante
com cheiro ardente
o caule mergulhado
na água fria
sobre as pedrinhas,
de "alagamar".
A luz ofuscou
e respirou fumaça,
viu os dramas
presenciou felicidade
fez-se forte
e cheirou ardente,
com pétalas brancas
alvejadas pela brisa
que já não existe,
aguentou quanto pôde
sem respirar.
A água fria
estava podre,
as pedrinhas
feriam seu caule,
o bugari sucumbiu
só pra fazer alguém feliz,
a natureza fugiu
e a flor feneceu.
Chl.
Out/1978

quinta-feira, agosto 11, 2005

DJALMA MARANHÃO



Era 1961. Morava na Campos Sales em frente ao seminário São Pedro, que naquela época tinha uma atividade religiosa intensa, além de um grande número de seminaristas. Estudava no Colégio Marista, na primeira série B, onde formamos um time de futebol de salão ao lado de Washington, Bel, Jair, Toinho Barbosa e Alexandre Bebé Chorão, o técnico era Irmão Anchieta.
Fora do colégio, o esporte preferido, era jogar botão; vidro inquebrável, baquelite, plástico derretido, lixa dágua e parafina, eram materiais indispensávais pra se fazer um bom time. Os beques mais fornidos, tinham ângulos de 90° para chutar bola (botão de camisa) rasteira e os atacantes formavam ângulos mais abertos , com um bico de gaita pra chutar alto, cobrindo o goleiro, geralmente uma caixa de fósforos.
Toda manhã ia para o colégio e quase sempre de carona num Bel Air azul,rabo de peixe,do Desembargador Carlos Augusto, junto com Caju, filho do Magistrado;a tarde era pra jogar botão com Avelino Piúba, Vicente Cabelinho, Gatinha, Ariston,Chico Caraolho, Escurinho, Jair, João Felipe,Chico Doido,Lourencinho, David, Dwigth, Iedo e a turma de garotos que freqüentavam o América da Rua Maxaranguape.
Resolvemos fundar o nosso próprio time de futebol de salão, o Corinthians. Fui escolhido presidente.
Na primeira reunião, tratamos de arrecadar fundos para comprar a bola, camisas,calções e meiões; o tênis era por conta de cada um. Demos um balanço nas mesadas e o resultado foi pífio, só dava pra comprar a metade das camisas; tínhamos quer ir à luta.
Reunimos uma comissão com três participantes e fomos ao centro da cidade para pedir ajuda aos comerciantes. Saímos pela Apodi, entramos na Deodoro, João Pessoa e finalmente Avenida Rio Branco, onde se concentravam as maiores lojas de Natal.
A primeira loja que entramos foi na Casa Duas Américas e encontramos logo na entrada o proprietário, um sujeito alto, musculoso,com bícepes se avolumando na camisa de mangas compridas, cabelos inpecávelmente penteados com brilhantina Glostora, era o Sr. Nagib Salha. –Senhor, nós estamos formando um time de futebol de salão e viemos pedir uma ajuda para comprar as camisas.
Nagib olhou de cima pra baixo pra mim, que a essa altura já tremia o corpo inteiro, enfiou a mão no bolso, abriu um sorriso e nos deu cinco cruzeiros. Pegamos o dinheiro e saímos felizes da vida. Em seguida fomos a Formosa Síria, Casa Rubi, Casas Cardoso até que chegamos na Ulisses Caldas, e resolvemos ir à prefeitura.
Chegamos no Palácio Felipe Camarão, por volta das três da tarde, entramos sem ser interpelados e fomos logo subindo a escadaria de madeira. Já no saguão que dá acesso ao Gabinete , uma senhora muito gentil perguntou:- O que vocês desejam?
-Falar com o Prefeito, respondi.
-Olhe ele aí.
Quando me virei, vi aquele homem alto de cabelos pretos ondulados, e me dirigi pra ele; eu estava gelado e tremia todo por dentro.
-O que você quer garoto?Perguntou Djalma,colocando a mão na minha cabeça.
-Senhor, nós fundamos um time e estamos pedindo uma ajuda para comprar o material.
-Time de que, meu filho?
-De futebol de salão, respondeu um dos amigos que me acompanhavam, pois eu já não conseguia falar.
Djalma, abriu um sorriso largo, enfiou a mão no bolso, que me pareceu bem fundo, de uma calça branca de pregas ao lado dos bolsos, puxou uma nota de vinte cruzeiros e me entregou, afastando-se com dois acessores, rumo ao Gabinete.
Saí andando de costas,olhando para aquele homem,que estava de costas pra mim.-Obrigado, balbuciei.
Aquele dinheiro, deu pra comprar nossa bola.

Chagas Lourenço

sábado, agosto 06, 2005

CASA DE DETENÇÃO

Centro de Turismo de Natal
(antiga casa de detenção)

A brisa bate no ferro
da tua grade,
na grade
da tua cela
onde por lei
trocastes
a liberdade
pela vida
que tirastes.
O barulho
longínquo e surdo
da onda
que se espraia
na areia
como se o mar
viesse a ti
indiferente
à lua
que o prateia.
E a bruma
e a brisa
e a lua
e o mar
companheiros de cela,
e do ferro
que a maresia
não come,
que a água
não molha,
mas que,
o visual
diz tristeza
diz dor
e te mostra
solidão.
Chl

Nov/1978

quarta-feira, agosto 03, 2005

O POUSO DO TETÉU

Arpege

Sexta-feira, oito da noite, entramos no aero-willys azul 65, e saímos a procura de um bar, de preferência um bar onde houvesse umas meninas, que pudessem nos acompanhar na noitada. Fomos ao Pouso do Tetéu.
Paramos o carro na Quinze e entramos no bar. –Traga um litro de Montilla e um tira-gosto de primeira.
Levantei fui até o garçom e indaguei se tinha gia, ele respondeu que sim e pediu pra escolher. Fui até um compartimento da cozinha onde havia um pequeno tanque de cimento, cheio de gias.-Pode escolher, falou o cozinheiro. Escolhi duas das maiores, sem pegar com as mãos apenas apontando. O cozinheiro colocou em cima de uma pequena tábua de madeira e com um facão amolado decapitou a rã e em seguida puxou toda a pele deixando-a nua parecendo uma moça no banho.
Voltei pra mesa e perguntei pro gordinho Batista, que estava conosco :-Você gosta de gia?
-Deus me livre, você tá louco? Acho que vou vomitar só de pensar naquele sapo nojento.
Tchuff, cuspiu no chão, temperando a garganta. Foi porisso que pedi um galeto novinho pra tira-gosto, pois sabia que você não comia rã.
A gia vinha em uma pequena travessa, forrada de alfaces, rodelas de tomate,cebola cortada , pedaços de queijo de coalho e azeitonas verdes, ladeados por uma porção de farofa, feita com a graxa da gia.
O prato era tão arrumado, que ninguém conseguia distinguir a rã de um galeto. O gordo Batista comeu até topar e pediu mais dizendo;- Ou franguinho gostoso, traga outra porção .
-Você acabou de comer gia, seu besta.
-O quê? Garçon , vou te matar! É verdade?
-É, sim senhor.
Então não traga mais não seu desgraçado, já comi, agora tá sem jeito.
Enquanto o gordo brigava com o garçon, entraram três meninas no ambiente. Eu estava sentado , encostado na parede, pra me proteger, porque no Pouso do Tetéu, de vez em quando, tinha briga . Na cintura um Smith and West 32, niquelado e cabo de madrepérola.
Convidamos as garotas pra sentar e nos ajudar a tomar o litro de Rum.
Depois de algumas horas, bebendo e escutando música brega, perguntei:-Tem algum lugar bom pra gente ir, conversar mais sossegado e a sós?Leila respondeu:- Tem Margô. Fica ali na dezeseis, perto do King Nigth Club de Rita Loura.
-Então vamos pagar a conta e seguir pra lá.
Quando chegamos, não tinha nenhum movimento na sala de recepções, o bar já estava fechado, apenas um empregado com jeito de viado com as chaves dos quartos na mão, para escolher.
Fui para um quarto no primeiro andar, com Leila, depois de subir por uma escada estreita e escura, pois só havia uma lâmpada no fim do corredor.
Entramos no quarto, ela acendeu um pequeno abajur, em cima de uma cômoda, com alguns vidros de perfume, um talco Palmolive e uma bacia média, onde ela colocou um pouco d’agua que tirou de uma quartinha colocada no chão ao lado da cômoda, pegou uma garrafa de álcool e derramou um pouco na bacia;era para lavar as partes quando terminasse.
-Pode tirar a roupa, foram suas primeiras palavras.
Um pouco acanhado, mas meio embrigado, fui rapidamente tirando a roupa e automáticamente ficando excitado, ao vê-la arrancar o vestido pela cabeça.
-Pode deitar na cama, gosto de ir por cima, continuava Leila conduzindo todo o processo.
-Que coisa grande menino, ela me encabulava e ao mesmo tempo me deixava mais excitado.
Sem nenhum tipo de carícia ou beijo, ela deitou por cima de mim e começou a cavalgar. Em alguns minutos ela já bem excitada começou a gritar:- Chico meu amor, meu macho, eu te quero...me fode....
Em seguida teve um orgasmo estridente e vigoroso que me levou junto, completamente suado e atônito, mas ao mesmo tempo muito gostoso.
Parou. Deitou do lado ofegante, acendeu um cigarro.
-Você é muito gostoso! Disse me agradando
-Eu não lhe disse meu nome, como é que você adivinhou?Perguntei.
-E como é seu nome? Ela respondeu perguntando.
-Chico.
-Chico é o nome do meu namorado e toda vez que eu transo , penso nele pra poder gozar. Ele é soldado do 16 RI, olha a foto .
-Ah bom! falei, olhando aquela foto ridícula do recruta de cabeça raspada.

                Frei Carmelo
                  Ago/2005

segunda-feira, agosto 01, 2005

O PRECONCEITO

Detesto o esperar
adoro o esperado.
Não suporto o julgar
gosto do julgado.
Rejeito o odiar
sinto pena do odiado.
Odeio o rejeitar
suporto o rejeitado.
Sou louco pra amar
morro pra ser amado.
Chl
Ago/1986

sábado, julho 30, 2005

ELE E A SAÚDE


Na tenra idade
ele e a saúde
estão juntos.
Continuam
na adolescência,
começam a brigar,
na juventude.
A saúde
começa a correr
atrás dele.
Ele
corre pra longe
da saúde.
Na meia idade
ele
resolve fazer as pazes
com a saúde,
que já não quer mais.
Na velhice
ele
corre desesperado
atrás da saúde,
ela
esnobando
corre dele
até o fim.
Chl
Jul/2005

quinta-feira, julho 28, 2005

O LUAR

A lua surgiu imensa
Cor de fogo
Longínqua, arredia
Temerosa e bela.
O amor apareceu
Ardente e forte
Queimando como fogo
Corajoso e belo.
A beleza do luar
O calor do amor
O medo
De tudo acabar.

Chl.
Out/1985

terça-feira, julho 26, 2005

A PLANTA

Precisa iniciativa
para plantar uma árvore.
Precisa esperança
para vê-la crescer.
Precisa perseverança
para esperar os frutos.
Precisa paciência
para colher.
Chl

Abr/2005

sábado, julho 23, 2005

AMANHÃ

Foto de Hugo Macedo

Como seria amanhã
se eu não estivesse aqui ?
sem meu "cavalo de pano" (rêde)
meu "escritório ambulante" (telefone)
o filme de guerra
e a cuca fundida,
a briguinha careta
a "cosquinha" legal
autocrítica, análise
e a conversa fiada.
A vontade de ver
firmeza no passo
a vontade de ser
um pouquinho feliz.
O mundo da dor
o desejo de amor
a vontade de amar.
Uma fossa danada
a cara amarrada
uma vida inteira
um caminho difícil,
pela frente a seguir.
Chl
Mai/1979

quarta-feira, julho 20, 2005

O BECO DA LAMA

Léo já chegou namorando
E Hugo fotografando
O Dunga sempre pintando,
A SAMBA em reunião,
Pra resolver a questão
Que virou um rebu danado
A história do pé quebrado
Com oito pés a quadrão

Roselis trouxe uma flor
Dizendo que era pra Clô,
Jornalista de valor,
Pra acabar a confusão.
E de todo coração,
Pediu pra deixar de lado
A história do pé quebrado
Nos oito pés de quadrão

José chegou todo prosa
E Meire querendo a glosa
De uma rima famosa
Que teve repercussão,
Segurando em sua mão,
José estava indignado
Com a história do pé quebrado
Dos oito pés de quadrão

Antoniel entregou a Tadeu
Um papel que ele leu,
De uma rima que escreveu,
Com singela perfeição,
Mas disse de antemão,
-Estou ficando arretado
Com a história do pé quebrado
Em meus oito pés a quadrão

O Barba chegou de "finim"
Se encostou lá num "cantim"
Só pensando no "chinim",
Quis entrar na discussão
E disse: Já tô com tesão,
-Isso me deixa tarado,
Essa história de pé quebrado
E os oito pés a quadrão

Mário chegou de repente
Ainda meio descontente
Por causa do deliquente
Que roubou seu violão,
Mostrando indignação
Disse: Tô eletrocutado
Com a história do pé quebrado
Nos oito pés a quadrão

Pe. Augustinho muito calmo
Com um livro na mão a palmo
Descreveu um lindo Salmo,
E recitou uma oração.
Com o livro ainda na mão,
Disse: Eu não fico calado,
Com a história do pé quebrado
Nos oito pés a quadrão

Ainda ressabiado,
Ele olhou pra todo lado,
E neste lugar sagrado
Abriu o seu coração.
E dando a sua benção,
Ele deu por encerrado
O assunto do pé quebrado
E acabou a confusão.

Chl

Jul/2005

segunda-feira, julho 18, 2005

O CORUJÃO

                                                         Ilustração: Laércio Eugênio

Era uma festa de carnaval de 1975. Nos salões do América Futebol Clube o uísque corria solto na mesa do bloco. No bolso um vidro de Reativan, na bolsa um tubo de lança Universitário (Argentina) e um lenço ou um tufo de algodão, para ingerir pelos lábios ao invés de cheirar.
Lá pelas três horas da madrugada, Chico já muito embriagado resolveu ir embora, estava exausto e completamente desorientado. Antes de sair para pegar seu Jeep sem capota, resolveu passar no banheiro, e no corredor do clube encontra a jornalista. –Aonde vai uma hora dessas? Ela perguntou.
-Mijar e depois vou pra casa, que estou morto.
- Dá uma carona? Também quero ir pra casa.
-Tudo bem, ele respondeu.
Saíram do América, entraram no Jeep e ela foi logo insinuando:-Por que não vamos na estrada de Ponta Negra comer um sanduíche ou talvez tomar um caldo?
Seguiram para a estrada de Ponta Negra e no início da via que hoje se chama Avenida Roberto Freire, tinha uma placa luminosa, que Chico tão bêbado nem prestou atenção o que era e achou que poderia ser a lanchonete . Era “O corujão” o segundo motel de Natal depois do Jóia na Ribeira.
Chico meio intrigado, mas completamente bêbado resolveu entrar. Nem caldo , nem sanduíche, nada. Só teve tempo de arrancar a fantasia e cair na cama como uma pedra e adormecer.
Algumas horas mais tarde, por volta das 10 horas da manhã, Chico acorda, com uma tremenda dor de cabeça e sem saber onde estava. Lembrou-se de um amigo, Mimoso, que era gordinho e muito branco, para telefonar e saber que lugar era aquele. Olhou para o teto tinha uma lâmpada vermelha muito fraquinha que deixava tudo na penumbra, olhou para o chão e viu um carpete surrado e cheio de marcas, de queimaduras de cigarros jogados ; ficou intrigado tentando adivinhar se ali era o inferno ou um cabaré, quando do seu lado alguém se moveu.Olhou repentinamente para o lado e viu aquele corpo branco e roliço, imediatamente imaginou :- Será que eu comi Mimoso?
Virou-se completamente pra conferir e viu que era a jornalista que foi logo dizendo:- Oi amor, bom dia!
-O que estamos fazendo aqui, perguntou Chico, emputecido.
-Até agora nada, ela respondeu.
Ele retrucou: -Graças a Deus !
Ligou pra recepção pediu um copo de leite gelado, dois Engovs e ainda ouviu da moça da recepção que o conhecia : - Você hein! Comeu a gordinha.
Ele desligou o telefone e disse: -É foda mesmo, vamos embora.

                Frei Carmelo
                  Jul/2005